Durante os primeiros dias do ano somos inundados por mensagens cheias de boas intenções. Desejos de felicidade, paz, saúde, prosperidade, etc... Parece-me um bom hábito, ainda que tenha uma forte componente protocolar. Acostumado a ouvir coisas menos agradáveis, acho positivo que esta onda atravesse o planeta por algumas semanas. No entanto, não sei se as bombas e o zumbido dos obuses da guerra russa na Ucrânia permitirão sentir ou compreender o conteúdo das belas palavras.
Enquanto comíamos, comprávamos, entregávamos presentes, enchíamos as cidades de luzes e nos cumprimentávamos, um país era bombardeado de forma impiedosa e implacável por outro muito maior e mais poderoso. Enquanto celebrávamos a ceia de Natal, famílias inteiras eram atingidas pela morte, pelo frio e pela fome. Enquanto um pai disfarçado de Pai Natal distribuía os presentes às crianças ricas, outras crianças eram apresentadas ao terror e à miséria, se não se deixarem levar pela morte que a guerra semeia.
Que mundo estamos a construir? Que mundo deixaremos aos nossos filhos e às nossas filhas? Como vamos convencê-los de que o diálogo e a negociação são as melhores formas de alcançar a paz se os mais poderosos resolvem os problemas com bombas?
Como lhes vamos explicar que todos os seres humanos, apenas pelo facto de serem humanos, têm direito à sua dignidade, se aqueles que atingiram o nível mais alto da dignidade humana matam inocentes por capricho?
Que tipo de escolas temos? Como é possível que delas saiam pessoas capazes de declarar e alimentar guerras, de matar e mandar matar, e olhar para a morte e contemplá-la com desdém? Penso que as línguas, a matemática e a história não serão suficientes. Temos de falar seriamente sobre solidariedade, compaixão, justiça, dignidade e liberdade. Temos de falar sobre política, sobre ética e sobre novas formas de organizar as comunidades e o espaço público. Para mim, é claro que o papel das escolas de hoje deve ser formar em primeiro lugar boas pessoas. Porque uma boa pessoa será sempre um bom aluno.
Agora que celebramos a entrada do novo ano (ao som dos bombardeamentos) vamos pensar um pouco mais sobre o inferno da guerra. Desta e de qualquer outra. Pensemos que destrói não um país, mas o mundo inteiro. Lutemos por um mundo diferente.
Desejo a todos e as todas um Bom Ano.
Júlio Silva
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