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terça-feira, 25 de julho de 2023

Crónica Cidadania Activa 31 Despovoamento: Mértola no limiar da ruptura!









Crónica Cidadania Activa 31

Despovoamento: Mértola no limiar da ruptura!

O concelho de Mértola, um dos mais extensos do País, é, porém, um dos mais despovoados e envelhecidos e, ao longo das últimas décadas, tem vindo a perder 100 habitantes por ano.

Um estudo recente vem, agora, revelar que houve uma antecipação em uma década do que era a previsão de 15 % apenas para 2030, revelando uma aceleração gravíssima e muitíssimo preocupante.

A população jovem – com menos de 15 anos –, que na década de 60 do século passado representava 27,9 por cento, é agora de apenas 8,8 por cento, enquanto que a população idosa – 65 ou mais anos – passou, no mesmo período, de oito para 36,8 por cento.

Na última década, lamentavelmente, a Câmara Municipal de Mértola, abandonou a estratégia global e integrada que tinha sido definida para tentar contrariar este processo de despovoamento, a qual contemplava desenvolvimento económico, habitação, emprego, serviços, apoios sociais, educação, transportes, e era complementada com o apoio financeiro à natalidade, e passou a apostar apenas nesta última medida.

Por outro lado, os sucessivos governos não têm tido políticas públicas coerentes, coordenadas e convergentes para captar, integrar e fixar imigrantes, sobretudo agora que temos carências de mão de obra em todos os sectores da economia. O actual programa de incentivos à fixação de pessoas no interior tem resultados irrisórios e apenas valor simbólico, mesmo nas zonas para onde tem havido uma procura mínima, o que não é o caso de Mértola.

Nas últimas eleições autárquicas, o actual presidente captou muitos votos dos jovens que ainda aqui vivem com promessas de emprego na câmara, criando, de uma forma enganosa, uma clientela partidária que tem vindo a satisfazer pontual e precariamente, sobretudo relativamente aos que as respectivas famílias poderão ter mais influência no próximo processo eleitoral local.

Estes poucos jovens que ainda aqui vivem, por opção ou porque têm receio de abandonar a sua zona familiar de conforto, irão, a prazo, sentir-se defraudados, porque a autarquia embora lhes garanta, precariamente, um emprego não está a investir séria e significativamente na criação das condições de habitação, emprego, saúde, educação, transportes, comunicações, etc, que lhes permita encarar com esperança e otimismo um futuro melhor num território que se quer vivo e dinâmico e onde gostariam de viver. Não é por acaso que a maior parte daqueles jovens que de cá saíram para estudar não esteja a pensar voltar, a não ser nas férias.

Que jovens podem pensar em fixar-se no concelho e aqui constituir família, se não têm acesso a habitação, a oportunidades de trabalho adequado às suas habilitações, a serviços de saúde, de educação, de transportes, de comunicações e de comércio?

O estudo acima referido conclui que o despovoamento em Mértola caminha a passos largos e rápidos para o limiar de ruptura, dado que se prevê que em 3 décadas estejamos reduzidos a uma população que não chega aos 4 mil habitantes, dos quais mais de 65% são velhos, num território com 1,297 kms quadrados de área.

É assustador!

Jorge Pulido Valente

quinta-feira, 20 de julho de 2023

Crónica Cidadania Activa 28 Água, oferta e procura / Crónica Cidadania Activa 29 De Boca em Boca! / Crónica Cidadania Activa 30 O Estado da Nação


 






Crónica Cidadania Activa 28

Água, oferta e procura

O tema da água esteve, na passada semana, mais uma vez, em foco no baixo Alentejo e noAlgarve, quer devido à prolongada e severa seca que continua a fazer-se sentir, quer pelaapresentação pública do Plano de Acção da Intervenção Territorial Integrada Água eEcossistemas e da aprovação em Conselho de Ministros do Plano de Eficiência Hídrica doAlentejo. Também em Mértola, o tema foi objecto de reflexão e debate no âmbito de maisuma sessão do projecto Life Desert Adapt, promovida pela Associação de Defesa do Património.

Duas abordagens distintas/opostas assentes em dois modelos de desenvolvimento diferentesse contrapõem e confrontam: a que tem como principal objectivo responder à crescente edesenfreada procura de mais água para uma agricultura financeira de regadios intensivos,ambientalmente insustentável, e a que tem como prioridade a sustentabilidade ambiental,social e económica dos territórios e a sua adaptação às alterações climáticas, intervindopreferencialmente no lado da racionalização da oferta e da utilização deste escasso recurso.

A ITI Água, começada a ser desenhada, nas múltiplas dimensões da sustentabilidade doterritório marginalizado da fronteira do Baixo Alentejo com a Serra Algarvia, na altura em queestive na CCDRAlentejo, irá criar uma oportunidade única de responder ao recorrente desafiode responder de forma inovadora à escassez de recursos hídricos e, simultaneamente, deincrementar, dinamizar e apoiar projectos de valorização e desenvolvimento assentes nosrecursos naturais, na biodiversidade, na bioeconomia e na economia circular.

O Life Desert Adapt também se foca sobretudo na implementação de soluções práticas esustentáveis para os graves problemas hídricos dos vastos e esquecidos territórios dosequeiro, de modo a garantir a sua sobrevivência e adaptação às severas condições climáticas. Já o Plano de Eficiência, embora inclua algumas medidas positivas que visam aquele objectivo,através da redução das perdas brutais nos sistemas de regadio público intensivo, foca-sesobretudo nas intervenções para aumentar as disponibilidades hídricas para as captações, paraalimentar uma agricultura intensiva de lucro fácil e rápido, promovida por fundos financeiros nada preocupados com os territórios que exploram até à exaustão.

Causam-me especial preocupação os projectos (alguns já em fase de projecto de execução)que irão contribuir para “secar”, “salinizar” e artificializar ainda mais o rio Guadiana, atravésdo represamento da água das ribeiras afluentes e da tomada de água no Pomarão para reforçodo abastecimento ao Algarve para regar culturas permanentes de elevado consumo, como é ocaso dos abacates. Situação que se irá agravar drasticamente com as exigências de contrapartidas que do lado espanhol já surgiram.

Continuar a apostar em responder às crescentes e infindáveis exigências por parte de umaprocura irracional e insustentável é caminharmos para um suicídio ambiental no curto prazo eeconómico no médio prazo.


Crónica Cidadania Activa 29

 De Boca em Boca!

Esta semana tive a oportunidade de assistir e participar na sessão “Eu não sei se sei contar…” do projecto de Boca em Boca, da Rita Sales e do Pedro Bravo, que se realizou no Centro Histórico de Mértola, frente à Igreja Matriz/antiga Mesquita.

Parabéns à Rita, ao Pedro e a todos os que conceberam e realizaram este maravilhoso, entusiasmante e envolvente espectáculo!

Este projecto cultural é exemplar a todos os níveis: uma investigação, estudo e conhecimento real do território, das suas comunidades e do seu riquíssimo património, nomeadamente oral, serve de base a um conjunto de sessões, descentralizadas em aldeias e montes, que, por um lado, recuperam o imaginário ancestral dos seus habitantes e, por outro, constroem com os participantes nos espectáculos narrativas que recordam e valorizam um mundo rural quase extinto. É um exercício de recuperação de memória colectiva muito participativo, partilhado, envolvente e extremamente emotivo.

Distingue-se, também, porque agrega e integra outros grupos e áreas culturais, como o teatro e a música, conseguindo, assim, dinamizar ainda mais a actividade cultural no seio da comunidade.

Finalmente, conseguem, nos espectáculos, imprimir um ritmo e um ambiente de alegria que contagia todos os que assistem e os envolve como actores e figurantes.

A encenação é muito cuidada e original, embora simples, criando, com facilidade, o cenário apropriado, evocativo das épocas em que decorrem as histórias.

Mértola já precisava de um projecto cultural como este, tendo em consideração o rico património cultural imaterial em risco de desaparecer e a necessidade de realizar iniciativas e actividades que, estando a ajustadas à realidade local e aos gostos das comunidades, sejam capazes de envolver as populações e chamá-las à participação.

Obrigado! Continuem a presentear-nos com estes excelentes e inspiradores momentos culturais e de cidadania activa.


Crónica Cidadania Activa 30

O Estado da Nação

É inegável, os números comprovam-no, que no imediato a economia do país está melhor crescem as exportações, o desemprego diminui, as receitas fiscais aumentam, os lucros da banca, das grandes empresas de distribuição e de energia, entre outras, aumentam extraordinariamente. No entanto, os juros altos, e ainda a crescer, e a inflacção a manter-se, mpedem que as classes média e baixa, com salários e poder de compra reduzidos e com encargos mensais e impostos elevados, possam beneficiar da melhoria das condições da economia.

Tendo-se iniciado o principal período de férias dos portugueses, os sinais do agravamento da situação económica das famílias, estão á vista, por exemplo, na diminuição significativa de turistas nacionais em destinos turísticos como Mértola e de veraneantes nas praias do Algarve e nos respectivos restaurantes, bem como nos consumos aí realizados.

Por outro lado, as carências de mão de obra, sem que haja uma política pública de captação e integração de imigrantes, está a começar a pôr em causa muitos dos investimentos previstos e a atrasar significativamente a concretização de muitos outros.

Se a economia do país está melhor, mas as pessoas não o sentem no bolso, já os serviços públicos, no geral, estão muito piores e os cidadãos sentem-no, todo os dias, na sua vida e na sua carteira, apesar de pagarem impostos altíssimos.

No sector da Saúde, faltam médicos de família, as urgências estão no limiar da ruptura, as listas de espera para consultas e cirurgias não há meio de reduzirem, os centros de saúde não dão as respostas que os utentes precisam, concluindo, estamos pior e temos que pagar mais para ter acesso aos serviços mínimos. Cada vez mais portugueses, os que podem, desistem do SNS e recorrem aos privados

Na Justiça, estamos sujeitos a um sistema desigual para ricos e pobres, lento, ineficaz e ineficiente, enfim, todo o contrário dos atributos que a definem.

As carências de Habitação aumentaram e acumularam-se durante os últimos governos e ainda se vão agravar mais (nomeadamente por causa do aumento dos juros do crédito à habitação) e são muitas as dúvidas que se levantam quanto aos resultados, que só surgirão no médio/longo prazo, do programa recentemente lançado pelo governo.

A política da Educação está reduzida ao braço de ferro entre o governo e os trabalhadores da escola pública, com os prejuízos daí decorrentes para as nossas crianças e jovens e para o seu futuro. Entretanto, um estudo recente, vem demonstrar quão injusto e desigual é o sistema de ensino em termos territoriais e socio-económicos, favorecendo claramente os que dispõem de maior rendimento e residem nos maiores centros urbanos e dificultando, por falta de oportunidades, a utilização deste elevador social aos que habitam as regiões periféricas e rurais.

Apesar de ter sido criado um ministério da Coesão e se ter dado início a um processo centralista de regionalização, os territórios de baixa densidade continuam a sua trajectória de acentuada e preocupante perda de população e envelhecimento, bem como extinção ou redução de serviços de interesse geral, isolamento e abandono.

A área do Ambiente desapareceu do mapa político e do radar da comunicação social, porque todas as estratégias anteriormente aprovadas para este sector não avançam para a concretização de projectos, medidas e acções, falhando, assim, todas as metas definidas nacional e internacionalmente, só havendo conhecimento de decisões irresponsáveis no que respeita à eliminação de condicionantes e restrições ambientais nos processos de licenciamento., dando claramente prioridade à economia em detrimento da sustentabilidade.

O sector da energia é um bom(mau) exemplo do que se passa genericamente na Administração Pública: serviços com enormes carências de recursos humanos, envelhecidos, com burocracias processuais inúteis, sem meios de intervenção, descoordenados, desorganizados, ineficazmente informatizados - apenas substituíram (ou acrescentaram) o papel pelo (ao) computador -, incapazes de concretizar as políticas públicas. Vejam-se os já incontáveis pedidos de constituição de Comunidades de Energia Renovável (uma prioridade da política energética nacional e comunitária) que jazem no site da DGEG, sem qualquer andamento há meses.

Bem pode o primeiro ministro dizer que aos portugueses o que os preocupa é o dinheiro no bolso e não a governação ou as reformas estruturais e as politicas públicas, porque, de facto, quando o dinheiro não chega até ao fim do mês, é óbvio que tem que ser esse o principal foco do cidadão, mas nem por isso se evita que se instale na população o descontentamento e a revolta, à medida que o nosso dia a dia é cada vez mais dificultado e stressado pelo mau funcionamento das instituições e do país.

Jorge Pulido Valente

Nota: Motivos de saude e pessoais impediram-me de publicar estas 3 cronicas no devido tempo. As minhas desculpas

Carlos Viegas