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sábado, 24 de junho de 2023

Crónica Cidadania Activa 27 Simplex e Complex, um País a 2 velocidades


 






Crónica Cidadania Activa 27

Simplex e Complex, um País a 2 velocidades

A reforma e modernização da administração pública é um processo complexo, difícil e demorado que para ter sucesso necessita de uma vontade política forte, uma estratégia bem definida, um plano de acção integrada rigoroso e exigente e uma coordenação forte e eficaz.

Como tal não existe e nunca existiu (e não sei se alguma vez existirá) o que temos é um País a 2 velocidades, em que alguns organismos do estado avançaram bem e depressa no Simplex, desburocratizando, informatizando, simplificando e agilizando procedimentos e processos, com excelentes resultados, e outros, apenas transferiram a burocracia dos papéis para a dos computadores.

Dois exemplos elucidativos das diferenças: alteração do registo de veículos e do registo de embarcações.

No primeiro caso, o processo gerido pelo IMT, com a colaboração das conservatórias, é simples, rápido, fácil, barato e cómodo para o cidadão. Preenche-se um impresso em papel ou on line, os intervenientes assinam, entrega-se no balcão da conservatória e passada uma semana recebe-se em casa um certificado de matrícula em cartão plástico (resistente e durável). Há total interoperabilidade entre serviços e eficácia e eficiência nos processos, envolvendo mais do que um organismo.

No segundo caso, o calvário começa logo no primeiro passo, por não haver interoperabilidade e partilha de dados entre as duas entidades responsáveis pelos processos, a DGRM (BMar) e as Capitanias, pelo que o requerente, para dar início ao processo, é obrigado a fazer um registo (on line) do seu pedido no Balcão do Mar, carregando um formulário próprio devidamente preenchido e mais uma série de documentos, desde o livrete ao contrato de compra e venda da embarcação com assinaturas reconhecidas notarialmente.

Só após receber o despacho deste requerimento, por mail, se pode dirigir à Capitania respectiva (obrigatoriamente presencialmente), para entregar (tudo em papel) o dito, fazer um requerimento ao Capitão do porto e juntar mais toda a documentação que já carregou on line no BMar e, ainda, comprovativo do pagamento do IUC (se aplicável), da taxa de farolagem e uma certidão de não ónus ou dívidas sobre a embarcação, emitida pela conservatória da área onde o barco está registado (as conservatórias em locais onde não há capitanias desconhecem estas certidões). Se o barco estiver registado em Setúbal e o novo registo for em Faro tem que obter a certidão em Setúbal para entregar na capitania em Faro, arcando com todas as despesas que tal deslocação implica, incluindo perda de pelo menos um dia de trabalho, dado que não há interoperabilidade nos sistemas que permita a inclusão automática no processo.

A emissão do novo livrete, em papel e não em plástico (que seria mais apropriado tendo em conta o meio em que as embarcações se deslocam), não tem prazo para emissão, dependendo das capitanias, do volume de pedidos e do número de funcionários que nelas trabalham, e tem que ser levantado no balcão respectivo. Tive conhecimento de um cidadão que esperou um ano pelo livrete.

Para bem de todos, incluindo os funcionários envolvidos nestes e noutros processos, exige-se um Simplex na náutica de recreio, com a máxima urgência!

Jorge Pulido Valente

quinta-feira, 15 de junho de 2023

Crónica Cidadania Activa 26 Acessibilidades!?












Crónica Cidadania Activa 26

Acessibilidades!?

A convite do presidente da Cimbal, António Bota, esteve a semana passada em Beja, a fazer prova de vida numa reunião com os autarcas do Baixo Alentejo sobre acessibilidades e comunicações, o Ministro das Infraestruturas, João Galamba.

Da audição e leitura das declarações prestadas pelo governante e pelo presidente da Comunidade Intermunicipal, conclui-se que se mantêm as promessas, nunca cumpridas, feitas por sucessivos governos de há uma década para cá no que respeita ao IP8, às ligações ferroviárias e ao aeroporto, e se deixam cair todas as outras respeitantes às estradas nacionais/regionais e ICs.

António Bota esteve bem na afirmação das reivindicações e dos interesses da região nas suas declarações, mas triste e lamentavelmente não se ouviram os restantes autarcas do Baixo Alentejo tomarem uma posição e falarem publicamente sobre os problemas rodoviários dos seus municípios. Por exemplo, não vimos qualquer comunicado de Mário Tomé, presidente da Câmara de Mértola, a manifestar o seu descontentamento e a exigir compromissos do ministro no que respeita às estradas que ligam a sede de concelho a Almodôvar e Serpa, quase intransitáveis, e ao IC27, por concluir há décadas. Também é muito triste e lamentável que os deputados eleitos por Beja não tenham vindo a público apoiar e reforçar as posições de António Bota.

Quanto ao Aeroporto de Beja, as palavras do ministro demonstraram a sua ignorância sobre o assunto, dado que deu como adquirido o que a comunicação social erradamente veicula, de que aquela infraestrutura não estar a ter utilização, o que não corresponde minimamente à verdade, uma vez que só a componente voos regulares de passageiros não está a ter uma exploração contínua, e isso, por exclusiva responsabilidade do governo.

A electrificação da linha férrea Beja/Casa Branca, recorrentemente prometida e nunca executada, irá continuar no horizonte do médio/longo prazo, talvez em 2025 seja lançado o concurso da obra, ou talvez não! Quanto às comunicações volta a anunciar-se o que já tinha sido prometido pelo governo de José Sócrates, a cobertura total do território com fibra óptica. Para quando, ficámos sem saber.

Como António Bota disse e muito bem, este governo, com os milhões do PRR, “tem que olhar para o Baixo Alentejo com olhos de desenvolvimento”. Eu acrescentaria também o olhar da coesão territorial.

Lamentavelmente, o olhar é outro…


Jorge Pulido Valente

SEF sinalizou 47 vitimas de trafico de pessoas em academia- NÃO VOS FAZ LEMBRAR NADA?

 

In Jornal Publico de 15/06/23

Crónica Cidadania Activa 24 Poder Local (Anti)Democrático











Crónica Cidadania Activa 24

Poder Local (Anti)Democrático

É inegável que uma das maiores conquistas da revolução de 74 foi a instauração do Poder Local Democrático e que as autarquias têm tido, desde aí, um papel determinante nodesenvolvimento do País e no aprofundamento do exercício da democracia e da cidadania.

Porém, é tempo de avaliar, reflectir e debater o modelo de poder local que temos e que melhorias é preciso introduzir para prevenir e combater determinados comportamentos práticas e perversões do sistema político democrático.

Recentemente, em diversas reuniões de projectos em que tenho participado, são cada vez mais frequentes as queixas dos participantes relativamente à forma como a maioria das autarquias (Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia) lidam com as organizações de cidadãos, nomeadamente com aquelas que (ainda) não são totalmente controladas pelo partido no poder e que ainda conseguem ter iniciativa própria.

Os executivos municipais maioritários têm dificuldade em lidar com as oposições, com as opiniões divergentes (mesmo as que surgem no interior da sua própria organização), com as organizações e entidades independentes e autónomas, com os cidadãos com iniciativa e sentido crítico, enfim, tudo o que, na sua perspectiva, pode ameaçar o seu poder absoluto e o controle do eleitorado, indispensável para o perpetuar.

Os considerados não alinhados são ostracizados, proscritos, discriminados e, se necessário for, perseguidos e “castigados”. Instala-se, assim, uma cultura do medo que se traduz na autocensura de atitudes, comportamentos, acções e, até, de participações na vida pública e no exercício da cidadania.

Apesar de apregoarem os benefícios da participação e da cidadania activa e propagandearem modelos de governação partilhada e exercícios de discussão pública, praticam um centralismo democrático, em que só depois de tudo decidido na esfera do poder e traçadas as orientações a cumprir, se permite que o cidadão e as suas organizações tenham conhecimento e manifestem a sua opinião (já irrelevante nesta fase).

Nestes sistemas políticos locais a democracia representativa tende a transformar-se numa ditadura democrática (dado que é eleita livremente) porque têm ao seu dispor os instrumentos sociais, culturais, económicos e políticos que lhes permitem controlar e manipular o eleitorado para se manterem no poder.

Na minha perspectiva, para o Poder Local Democrático se cumprir inteiramente temos que ambicionar e caminhar para a democracia participativa, criando mecanismos que possibilitem que o mesmo não esteja exclusivamente nas mãos das câmaras e das juntas de freguesia, mas que seja efectivamente partilhado com as organizações de cidadãos.

Numa primeira fase, a melhor e mais fácil forma de pôr em prática este novo modelo é a criação em cada município de um Forum do Poder Local, no qual, em pé de igualdade estariam representadas as autarquias e as organizações da sociedade civil.

Jorge Pulido Valente