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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

É urgente o amor!

Dantes, em tempos que, de tão recuados, quase parecem pré-históricos, falava-se de amor. E era bonito falar de amor. As pessoas apaixonavam-se, eram felizes porque estavam apaixonadas e escreviam cartas longas, páginas e páginas dum assunto que sendo o mesmo, podia ser dito e escrito de tantas maneiras que parecia (ou era?) inesgotável.

Hoje, mudados os tempos e as vontades porque todo o mundo é composto de mudança, as pessoas continuam a enamorar-se, mas quando se enamoram, não falam com orgulho e felicidade desse amor, como se estar apaixonado e gostar apenas duma pessoa, em vez de várias ao mesmo tempo, tivesse, definitivamente, passado de moda. E não escrevem cartas de amor. Mandam “sms” que não podem guardar, ciosamente, numa caixa, nem atá-las com um laço rosa que dá prazer desatar para reler. E quando se referem à pessoa amada, não o fazem com o orgulho dos que sabem ter consigo “o melhor do mundo”, antes dizem, como quem exibe um troféu, “ando com a(o)…”

“Andar com..” ou “amar a(o)…” não é a mesma coisa, mesmo tendo em conta que entre uma forma de estar e outra, nos separam mundos. E tempos.

Acredito que quem “anda com” seja capaz de descobrir que ama durante o “trajecto”. Mas quem ama e assume que ama, com pudor ou despudoradamente, já começou a amar antes de iniciar o “percurso” e a sua felicidade é a felicidade do outro. Por isso, embora sabendo quantos mistérios encerra a mente humana, a maior parte ainda muito longe de podermos entender ou descodificar, não posso deixar de preocupar-me, enquanto mulher e cidadã, com as notícias de tantos casos de violência doméstica, atingindo mulheres cada vez mais jovens. Nas últimas semanas, os relatos que nos chegaram, tiveram, todos eles, o pior desfecho, culminando com a morte das jovens às mãos dos namorados. Durante o ano de 2009, registaram-se já 42 tentativas de homicídio, com 26 vítimas mortais. O que esteve por detrás destes casos? O amor? Talvez atitudes exacerbadas de posse. Talvez ciúmes. Talvez dificuldade em perceber quem é o outro, o que significa para nós, que direitos tem. Talvez.

No momento em que escrevo, a televisão dá conta de outra notícia sobre um padre de Celorico de Baixo que se apaixonou por uma jovem e fugiu com a sua amada para Espanha. E termina a notícia com uma pergunta – Amor ou pecado?

Embora a pergunta não me tenha sido colocada, directamente, apetece-me responder – Amor, sem dúvida! Pecado, porquê? Pecam os outros homens e mulheres que amam? O amor é bom ou é mau? Se é bom, como pode ser pecado?

A pergunta relança, afinal, a questão, sempre adiada, do casamento dos padres. Em pleno século XXI, mudados que estão tempos e vontades, é tempo da Igreja discutir, com abertura, esta questão. Os padres, escolhendo como forma de vida, estar ao serviço das pessoas e das comunidades, difundindo a sua fé, têm direito a amar não só a Deus. E serem felizes. Prefiro, sem sombra de dúvida, esta notícia às que relatam cenas de violência, intolerância e ódio. E põem em causa a dignidade das mulheres enquanto seres humanos.

Se trouxermos aos bancos da escola uma matéria tão importante como a educação sexual, talvez tenhamos que reformular o programa e introduzir, antes dessa, uma “cadeira” que ensine os nossos jovens a amar. Com o coração.

Porque é urgente o amor!

2 comentários:

  1. Sobre a questão dos padres ou do amor que se possa sentir, somos humanos, e como tal temos sentimentos; quem é que não ouviu já falar em médicos que morreram de cancro ou de policias apanhados a roubar, etc. vai tudo dar ao mesmo.
    Na minha singela opinião, no que toca à violencia doméstica, para um individuo que o padrão familiar passa por, o homem lider e senhor da casa e a mulher um mero complemento e depois vê este modelo dar uma volta de 180 graus, ou seja, a mulher passa a ser o motor de desenvolvimento do lar e ele desempregado e sem voto na matéria, acompanhados quase sempre de um nivel intelectual baixo, as soluções mais obvias para estas cabeças são repressão e a força, a unica forma de mostrar á mulher que ele ainda manda. Com um sistema que favoreçe os infratores, cada situação è sempre mais violenta que a anterior, até á tragédia.
    Ainda temos de deixar passar mais algumas gerações até á aceitação da mulher como igual na sociedade. Com a igreja a mesma coisa enquanto se tentar sobrepôr a hipocrisia à natureza humana, mais cedo ou mais tarde vamos ter a mensagem católica a passar completamente ao lado do alvo. Talvez o tempo que seja preciso para o homem ver a mulher como parte de nós numa relação. è o mesmo tempo que a igreja precisa para adequar a mensagem ao seus fiéis.

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  2. Quanto eu não apreciei o artigo da D. Maria Fernanda Romba no Correio do Alentejo! Além da beleza literária que costuma imprimir as seus escritos, o tema escolhido - o Amor, a necessidade de amar também com o coração - levou-a a sérias reflexões que a sociedade actual nos convida.

    Claro que "todo o mundo é composto de mudanças". Mas a vertigem dos tempos é tal que às vezes não deixa tempo para reflectir sobre as mudanças!
    O recato da vida de outros tempos, o namoro "às escondidas", o "falar" da rua para a janela, as cartas de amor que a D. Fernanda tão bem invoca, guardadas ciosamente numa caixinha atada com um laço cor de rosa... agora substituídas por "sms"... fazem já parte de um passado que não voltará! A emancipação da mulher, a descoberta da pílula, a desvalorização do próprio conceito de virgindade feminina, a entrada da mulher no mercado de trabalho, a "dessacralização" do casamento se não mesmo a própria desvalorização deste como insituição, substituído por outras formas de família e modos de viver, a IVG, um pouco de tudo isso terá a ver com algumas das constatações que terão levado a autora a reflectir sobre elas. "Andar com", como muito bem diz, não é mesma coisa do que "amar". Como se a vida lhes fugisse a uma boa parte dos nossos jovens...!

    Depois, o problema instante da violência doméstica, com que nos deparamos a cada passo. Eu creio que esta terá sempre existido mas só desde há pouco entrou nas preocupações sociais e com a visibilidade que os media lhes emprestam e, apesar disso, longe de ser banido da sociedade portuguesa o velho ditado "de que entre marido e mulher nunca metas a colher". Não obstante, parece estarmos a assistir a um pico intolerável de violência doméstica para os nossos "brandos costumes". Uma violência que veio para ficar? Ou apenas mais um reflexo de tempos difíceis que atravessamos, como, por exemplo, o desemprego crescente que nos atinge?

    Por último, não posso estar mais de acordo com tudo o que escreve a propósito do celibato dos padres. Do que se tratou, no caso do jovem sacerdote de Celorico de Basto, foi de AMOR, não de pecado. O que acontece é que a religião, a Igreja Católica tem dificuldade em se adaptar às mudanças. Só muda mesmo na hora de mudar e geralmente chega sempre muito atrasada! Ou porque as evidências da ciência a obrigaram a isso ou quando se perfila no horizonte a debandada dos seus crentes. Nunca o Amor foi um pecado...

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