Santuário estava lotado para receber
Francisco. E até o sol apareceu num dia em que se previa muita chuva. Para os
crentes foi uma graça para o bispo de Roma, para os não crentes foi só uma
coincidência
As velas acenderam-se às 9 da
noite. As velas, os telemóveis e a luz brilhante do terço gigante da obra
criada por Joana Vasconcelos iluminaram a segunda entrada do Papa Francisco no
Santuário de Fátima. Desta vez, fazendo parte do caminho a pé, saudando de
perto muitos peregrinos. Chamam-no pelo nome: "Francisco, Francisco".
O Papa conversou com alguns deles, estendeu-lhes a mão e riu-se para as
crianças que lhe pediram autógrafos, como se de uma estrela pop se tratasse.
E porque não? Ele é uma
estrela pop. "Ele é o Papa do povo, vem ao encontro dos pobres e das
pessoas que mais precisam", dizia José, que veio da Nazaré com a mulher,
Maria Alzira, ambos com mais de 70 anos e que às 10.00 já estavam sentados
junto às grades do Santuário. Uma estrela pop capaz de pôr uma multidão em
êxtase, aos gritos, como se viu à tarde, quando chegou ao Santuário pelas
18.15. "Vem peregrino da esperança, vem peregrino da paz", era o
cântico da receção, acompanhado por lenços brancos agitados no ar. E que agora,
apenas com a sua presença, põe uma multidão em silêncio e convida à introspeção
para a bênção das velas. Não há números oficiais mas há a certeza de que ali
não cabe mais ninguém. Encontrões. Apertões. Uma hora antes da cerimónia da
noite já era impossível circular no Santuário.
Depois da chuva, o sol
Este era o momento por que
todos esperavam. Aquele que os fez vir. Que justifica as bolhas nos pés, o
corpo enregelado, as noites mal dormidas, os dias de férias metidos em maio sem
ser para ir à praia. "Mas com muita alegria", garante Pedro, que veio
de Odivelas a pé. A alegria dos peregrinos é a prova mais viva da sua fé. A
noite anterior não tinha sido fácil para os que ficaram ao relento no
Santuário, nem para os que estavam nas tendas e muito menos para os que ainda vinham
a caminho de Fátima. Choveu muito e o vento não deu tréguas. Mas a manhã trouxe
o sol e as nuvens foram-se abrindo pela tarde. Sol para o Papa Francisco, dizem
os peregrinos. Uma coincidência, dirão os não crentes.
Fim da manhã. No topo do
recinto, Tito explica a um grupo de peregrinos vindos do Belém do Pará, no
Brasil, tudo sobre o Santuário: onde comprar as velas, onde as devem colocar
depois de acesas, qual o melhor local na "esplanada" para assistir às
cerimónias. "Circulem um pouco mas estejam aqui antes das 15.00 para
assegurarem que têm um bom lugar. Sem dúvida que vai estar lotado mais
logo." Tito lidera o grupo de 51 peregrinos, todos com camisolas
estampadas com imagens do Papa Francisco e de Nossa Senhora. "Ver este
Papa e ainda por cima em Fátima é um sonho que a gente concretiza", diz,
um pouco emocionada, Socorro. "Somos todos devotos de Nossa Senhora. A
Nossa Senhora é só uma, seja de Fátima, do Socorro ou da Aparecida, é a mãe de
Jesus."
Ao longo do dia, os
peregrinos não param de chegar. O grupo maior é o dos três mil jovens do grupo
"Eu acredito" com as suas blusas azuis turquesa e os cânticos
alegres. "Esta é a juventude do Papa Francisco", gritam, anunciando a
chegada ao Santuário. Mais silenciosos, concentrados nas orações, os 330 peregrinos
de Fernão Ferro são uma mancha cor de laranja no meio da multidão.
O grupo de 56 peregrinos do
Burkina Faso também chama a atenção com as suas roupas coloridas. Cantam numa
língua estranha mas o padre Gaetan fala inglês e vai metendo conversa com
outros peregrinos: "Union in pray", unidos na oração, diz-lhes,
distribuindo abraços. Vieram do Burkina Faso de propósito para ver o Papa?
Gaetan sorri: "Não, para rezar. Para rezar a Nossa Senhora de Fátima. Nós
crescemos na fé e na esperança e acreditamos que através de Nossa Senhora de
Fátima encontraremos Jesus Cristo. Essa é a razão pela qual vimos cá."
Enquanto se dirige para a Basílica da Santíssima Trindade, Gaetan tem ainda
umas palavras de apreço para a humildade de Francisco: "Ele é um bom representante
de Deus na terra."
Depois de Francisco, o Benfica
Ao início da tarde começa a
tornar-se difícil caminhar no recinto. As ruas também já estão muito cheias. De
pé, em bancos, sentados no chão. Ao longo de quase todo o caminho que vai do
estádio novo de Fátima até ao Santuário, o caminho que o Papa Francisco fará no
"papamóvel", há peregrinos. Amontoam-se junto à rotunda dos
Pastorinhos, ocupam as bermas. Cantando, alguns deles. Aplaudindo a chegada dos
grupos a pé. A voz de Paula é a que mais se destaca, por causa do altifalante:
"Viana a pé saúda os peregrinos da Trofa." Ou de Lisboa. Ou do Prego.
Ou de outro sítio qualquer. E o grupo de Viana em peso canta-lhes uma canção
para os animar. São 83 com blusas brancas e amarelas com uma imagem de Nossa Senhora.
Saíram de Viana do Castelo na sexta-feira, dia 5, e chegaram a Fátima, na
quinta-feira - 11.
José António Dias, empresário
de 58 anos, não veio em nenhum grupo. É um peregrino sozinho, vindo de Alhandra
e traz uma T-shirt branca com letras vermelhas que dizem: "I love Pope
Francis". José António não é devoto absoluto de Fátima - "Não sei se
a Nossa Senhora apareceu aos pastorinhos mas sei que este local tem uma energia
especial. Alguma coisa aconteceu aqui" - mas acredita que Francisco
"é o único líder político que poderá fazer alguma coisa positiva pelo
mundo". Talvez até possa fazer alguma coisa pelo Benfica diz, entre risos:
"Neste 13 de maio podemos juntar as duas religiões, seria fantástico
celebrar o campeonato neste ambiente." Se tudo correr bem, depois da
visita do Papa, a rotunda dos Peregrinos voltará a encher-se, mas de adeptos de
blusa encarnada. "A GNR diz que só vamos poder ocupar o passeio mas pode
ser que não..." diz, esperançosa Carla Anjos, que espera servir muitas
imperiais esta noite na Casa do Benfica, junto à rotunda dos Pastorinhos, ou,
como lhe chama "a rotunda do Marquês de Fátima".
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