"A avó Clementina era uma mulher alta,
mas não era altiva. Não dava ordens. Convencia os netos com palavras mornas e
todos faziam o que ela queria. Tinha só um dente, bem no meio da boca, o que
lhe dava um aspecto cómico e usava o cabelo apanhado num carrapito. E ria, ria
muito. Talvez de nervoso, talvez de insegurança, talvez por saber pouco das
alegrias da vida. A avó dizia coisas muito engraçadas e por vezes trocava o que
queria dizer por palavras completamente
desadequadas às situações, como por exemplo dar os parabéns a uma viúva em vez
dos pêsames ou chamar a vizinha mais próxima porque tinha um bicho em casa e
não sabia muito bem se era cobra ou se era iró. Os serões em casa da avó, à
volta da braseira, comendo fatias de ovo, eram a única coisa que amenizava o
frio e o cinzento do inverno, que ela detestava. A avó Clementina, por vezes
perdia a paciência e quando não nos conseguia acalmar ou nós não lhe
obedecíamos, dizia à laia de ameaça velada “Não sejas revenhosa…” Fosse lá o
que fosse o significado da palavra, resultava.
Quando eu
era miúda, a casa dos tios era o melhor das férias grandes. Ir para a horta
regar, ver os animais, brincar e correr em liberdade pelos campos, era uma
felicidade. Estar com as primas era tão bom. E havia a avó Inês. A avó Inês era
calma, serena, tinha um sorriso encantador e uma voz tão doce. A sua paciência
era ilimitada e permitia-nos não ter muitos horários nem muitas regras.
Lutadora, em tempos difíceis de privações, criou os filhos sozinha, pois a
viuvez veio precoce. Como a avó era muito baixinha, eu sentia-me já grande e
muito importante pois estava quase da sua altura. Os jantarinhos feitos na
panela de barro e cozinhados lentamente na lareira eram inigualáveis e ainda
hoje lembrados quando se fala do passado. A avó Inês foi a melhor contadora de
histórias do mundo. À noite, pela fresca do serão ou à luz do candeeiro a
petróleo, reuniam-se as primas para ouvir as histórias contadas com a magia da
voz da avó. O touro azul, A formiga rabiga e as histórias com príncipes e
princesas e palácios faziam as delícias e aguçavam a imaginação e o sonho… E o
soninho vinha tranquilo.
Tenho
saudades das Avós…"
Celeste Contente 26/07/2017
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